#2 De Volta pra minha terra, mas sem Protagonismo!
- Marcelo Honório

- 16 de abr.
- 3 min de leitura
Atualizado: 17 de abr.
Essa semana eu voltei à cidade que praticamente me originou: Catalão. Quase todo mês eu pego 100 kms da estrada de tijolos amarelos para chegar em Goiás, o meu Kansas Tupiniquim.
Apesar dos roteiristas da minha série terem me dado um spin-off (Cerlo em Udia), eu ainda faço participações especiais no seriado antigo, minha eterna Malhaçaum. Só que dessa vez, algo diferente aconteceu. Não me deram um enredo, não me deram uma história, eu não estava em cena. Eu fui apenas espectador!
E então surgiu a nossa primeira protagonista: a neura. Um gay fora de cena seria um problema ou um sossego? Pra quem? Por que ele não está no ar? O que ele faz quando não está na mira de um holofote? Ele precisa de um holofote? Me fiz essas perguntas, na medida em que percebia o que estava acontecendo.
O episódio começa com Izabel aguardando a visita de um de seus filhos. Na sua chegada, um abraço apertado, um beijo no rosto e perguntas como: "Chegou bem?", "Tá com fome?", "Lá também tá fazendo frio?". Era tarde da noite e minha mãe me enchia de amor e perguntas.
Após o jantar, depois de sanar todas as suas urgências, ela sorriu e me falou:
"Filho, li sua crônica três vezes, acho que entendi algumas coisas".
E de fato ela entendeu. Minha mãe havia entendido a mensagem da crônica anterior e com isso me entendeu um pouco mais. Ela entendeu que ser hétero tem seus privilégios e que as diferenças existem e precisam ser respeitadas.
Com toda sensibilidade do mundo, Izabel terminou a cena dizendo que pensa em retomar com os estudos e que adoraria um dia ser, também, psicóloga. Eu, enquanto espectador, fiquei com os olhos marejando. A personagem mãe arrasou na cena — não me coube dividir o tempo de tela. Era tudo dela. O que me coube foi estar na cadeira da frente aplaudindo em silêncio. Emmy winner do meu coração!
E eu continuei esquentando a cadeira, pois logo no dia seguinte, mais dois personagens roubaram a cena: Genivaldo e Zuleica, o meu casal de professores preferido!
Me chamaram pra um barzinho, pra uma jantinha. E novamente, perguntas do tipo: "Como é que está lá em Uberlândia?", "Como vão as coisas do trabalho?" surgiram no episódio. Eu falo novamente porque assim como as de Izabel, essas perguntas possuem cheiro e recheio de afeto.
Respondi como quem não tem muito o que dizer e me contentei em ficar mais no lugar da escuta.
Conversamos sobre os alunos, vida financeira, preocupações do dia a dia. Zuleica comentava que andava sem tempo. Eu, ouvinte-espectador, me identificava e lamentava. Ser adulto é um saco.
E pra piorar, ser criança é um laudo. Genivaldo desabafava:
"Hoje em dia tudo tem nome, tudo tem um diagnóstico. Tá difícil ver o menino por trás disso.”
Algo que me pegou. Porque por mais que ele falasse da escola, de crianças, talvez isso conversasse com todos nós. De como a gente, em alguma medida, foi reduzido a códigos, transtornos, padrões. Sempre me aparece um analisando se questionando se não tem TDAH.
Me dei conta que o olhar de Zuleica e Genivaldo buscava o sujeito. São personagens que na sua narrativa não querem lecionar para siglas e termos do DSM. Eles estão cansados dessa patologização!
No terceiro dia, a vida resolveu seguir roteiro próprio — e eu, mais uma vez, fiquei fora de cena. Estava em outro bar com Mariângela, minha amiga mandraka.
Depois de algumas horas bebendo com ela e seus novos amigos, fui me cansando e decidi cochilar no banco do seu carro, enquanto ela movimentava a própria história. Quando acordei, ela já estava com o sorriso nos olhos e o coração disparado: tinha acabado de pedir sua namorada em namoro.
Eu não vi. Nem sequer espectador eu fui nesse momento, mas tudo bem. Nem sempre a gente participa do clímax do outro. Às vezes, a gente só empresta o tempo ou o ouvido depois.
Voltar a Catalão, dessa vez, me ensinou que a vida não exige que sejamos protagonistas o tempo todo. Às vezes, a melhor atuação é saber sair de cena. O palco pode ser do outro. O foco, também.
E que, talvez, esse desejo de estar sempre no centro, de ter sempre uma fala, seja algo que nós, gays, carregamos como defesa. Mas há algo de libertador em apenas estar. Sem performance. Sem story. Porque protagonista mesmo... só da nossa própria história.
Chegando em Uberlândia, recebi uma mensagem da Garibalda, minha outra amiga, pedindo socorro. Fiquei curioso pra saber: nesse novo episódio, serei protagonista, coadjuvante ou mero espectador? Te conto essa história na próxima crônica!
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